- Saco de feijão
Mesmo depois do samba virar uma indústria, muita gente boa continuou compondo só por prazer, embora uma gravação sempre seja bem vinda. Ou melhor, quase sempre. Beth Carvalho começou como cantora de “MPB” mas logo “desguiou” para o samba. De início esteve muito ligada à Mangueira, sua escola de coração e a Nelson Cavaquinho, seu compositor favorito.
Mas em meados da década de 70, Beth passou a também prestar atenção na Portela e nas pérolas escondidas dos seus compositores tradicionais. Em uma roda, Beth veio a conhecer um samba genial de Chico Santana, um dos baluartes da Velha Guarda da Portela. Basta dizer que foi ele quem compôs o hino da Portela e da sua Velha Guarda.
Em plena ditadura militar, com censura aos jornais, arrocho salarial, greves reprimidas a ferro e fogo e a cada plano econômico a situação só piorava. A inflação começava a disparar, deixando o trabalhador sem ter para onde correr.
Chico Santana respondeu com o samba Saco de Feijão, mas ele só o cantava nas rodas, para os amigos. Beth, que já era uma cantora de sucesso, insistia em gravar, mas Seu Chico não queria, tinha medo de ser preso.
Quando ele afinal aceita, a música estoura nas rádios de todo o país como um grande sucesso. Samba um, Ditadura zero:
Dinheiro para que tanto dinheiro
Dinheiro, só pra gastar
Que saudades tenho do tempo de outrora
Que vida que eu levo agora
Já me sinto esgotado e cansado
de tanto penar
Sem haver uma solução
De que me serve um saco cheio de dinheiro
Pra comprar um quilo de feijão?
No tempo do mil-réis e do vintém
Eu vivia muito bem
Sem haver preocupação
Eu ia no armazém do Seu Manoel
com um tostão
Trazia um quilo de feijão
Depois que inventaram
o tal cruzeiro
Eu trago um embrulhinho na mão
E deixo um saco de dinheiro
Ai, ai, meu Deus…