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Histórias do samba – 8. Candeia dá a volta por cima

8. Candeia dá a volta por cima

Todos conhecem o Candeia compositor de obras-primas. Nem todo mundo conhece o outro lado. Candeia era policial civil. E era mau e traiçoeiro. Quando queria prender alguém que fosse conhecido chegava perto do sujeito e dava-lhe um abraço: era a senha pra que seus colegas policiais prendessem o cara depois.
Aquilo ficou tão manjado que quando ele se aproximava duma roda o pessoal já ficava com medo de ganhar um abraço. Quando chegava na Lapa todo mundo corria: “Lá vem o detetive Candeia!”.

Certa vez ele chegou na Lapa e uma senhora não correu.

– Todo mundo corre de mim, porque só você não correu sua velha safada?

– Não corro porque o senhor é gente e eu não corro de gente, se o senhor fosse bicho eu teria corrido.

Furioso com a ousadia da velha, Candeia dá-lhe uma bofetada na cara. A velha olha firme pra ele e diz:

– O senhor me bateu com essa mão, mas essa mão não vai mais bater em ninguém

Cerca de uma semana depois, Candeia está de carro na Praça XV, onde na época havia um mercado de peixe. Sem querer, um caminhão encosta no carro de Candeia. Totalmente fora de si, Candeia desce do carro e atira nos dois pneus dianteiros do caminhão. Quando ia atirar nos pneus traseiros, é surpreendido pelo dono do caminhão que de dentro da caçamba dá-lhe um tiro no peito, Candeia vira e depois recebe outro tiro nas costas.

Paralítico, na cadeira de rodas, de início Candeia vai ao fundo do poço, fica tão deprimido que praticamente não sai de casa. Aos poucos, vai recobrando a alegria e organizando antológicas reuniões de sambistas em sua casa. Volta a compor. Algumas de suas músicas mais bonitas são exatamente dessa época.”

Marcos Alvito. Histórias do samba: de João da Baiana a Zeca Pagodinho. São Paulo: Matrix, 2013.