/AS AVENTURAS DA Dra. EU KA LIPTUS – 3. O ambiente universotário

AS AVENTURAS DA Dra. EU KA LIPTUS – 3. O ambiente universotário

03. Habitat da Dra. Eu Ka Liptus, o ambiente universotário

Reza a lenda de que a universidade era um lugar aberto, de encontros e debate intelectual. Eu Ka Liptus, ainda uma estudante, ouvira histórias inacreditáveis sobre professores que demoravam até 20 anos para produzir uma única tese, a tese da sua vida. Nunca chegou a crer em outra lenda, de que em priscas eras os estudantes tivessem até mesmo a liberdade de escolher o seu tema de iniciação científica.

Agora, não, todos sabiam, a regra é clara, diria Arnaldo Cézar Coelho: quem apita é o pesquisador-mor, devidamente armado com o chicote de pontinhos do CêNãosabePq. Naquela vala comum que era a graduação, a única coisa que interessava à doutora era garimpar novos valores. Pena que a iniciação científica passasse tão rápido. Quando os escravinhos estavam aprendendo a copiar direitinho ela já tinha que começar a adestrar novos bolsistas. Tudo pelo bem da ciência.

Era um ambiente pacificado. Cada coisa em seu lugar. Os laboratórios, bem equipados, com seus pesquisadores devidamente hierarquizados. Não se torturavam ratinhos, como o nome parece indicar, mas ali você entrava feito um bicho, um aluno cheio de esperanças de mudar o mundo, contestador, irreverente. E depois de uns seis meses já sabia o que era o Qualis, um programa nunca igualado no mundo, que qualificava, como o nome indica, as revistas importantes, as mais ou menos importantes e as sem importância nenhuma.

Além dos laboratórios, onde não entrava qualquer um, tá pensando o quê, tínhamos também as celas de aula, devidamente trancadas, para evitar a presença, a circulação e a aglomeração deste elemento perturbador chamado aluno ou aluna, ou alunx, que não é bom dar bobeira para a patrulha do politicamente correto. Cada professa-a-dor tinha o direito de se trancar com os alunos (e alunas e alunx etc) durante duas horas por vez. Até porque já fora cientificamente provado que depois de duas horas e até mesmo antes disso havia tentativas de suicídio coletivo e individual.

Em quase todas as celas, sempre o mesmo ritual. O professor explicava o texto, apenas o texto e nada mais do que o texto, para alunos que tinham que repetir o texto, apenas o texto, nada mais do que o texto. Na prova, uma questão sobre o texto, apenas o texto, nada mais do que o texto.

Havia, é claro, impertinentes que perguntavam para que o texto servia, qual era a relação dele com a realidade circundante, a vida lá fora e questões insignificantes deste tipo. Com um olhar reprovador e uma reprimenda bem dada eram logo colocados em seu lugar, sentados direitinho na cadeira.

Como vêem, estava tudo em seu devido lugar no ambiente universotário. A perfeição foi completada quando se construíram banheiros só para professores e outros só para professoras, além do banheiro para deficientes (não confundir, por obséquio). Como todos sabem, PhDeuses e PhDeusas não fazem número 1 e número 2 como todo mundo.

Restavam ainda alguns dinossauros prestes a se aposentar que gostavam de perturbar a tranquilidade daquele ambiente harmonioso onde florescia a ciência tupiniquim, mas deles trataremos na próxima história, que estes animais merecem alguma atenção.

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OBSERVAÇÃO: Esta é uma obra FICCIONAL, inspirada em processos realmente existentes, mas não em pessoas. Semelhanças com pessoas reais são apenas coincidência, sem dúvida fruto da frequência com que determinadas coisas ocorrem nos ambientes retratados.